Esse artigo foi apresentado no II People.NET in Education: Congresso de Redes Sociais Aplicadas à Educação.
Título: Colaboração e aprendizagem de línguas na Internet: o caso Livemocha
Autores:
Alexandre Campos Silva
Renato Kimura da Silva
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RESUMO
Esse trabalho busca uma discussão
a respeito de um modelo de aprendizado de línguas na internet. Analisamos a
rede social Livemocha, e verificamos como o modelo de interação baseado na
colaboração pode estruturar uma rede de ensino-aprendizado. O trabalho visa
elucidar: - Os distintos papéis que os nós da rede social exercem; - Os modelos
de colaboração possíveis, criados através da ideia de constante interação entre
os alunos, com a correção de atividades e o conceito de aluno-professor; - Os
incentivos e recompensas voltados ao engajamento social, que mantém e expande a
rede.
PALAVRAS-CHAVE: Colaboração, E-learning, Idiomas
INTRODUÇÃO
No que diz respeito a aprendizado
em ambientes virtuais, o Livemocha se destaca por um modelo fundamentado em
rede social, onde o ensino-aprendizado ocorre através da interação. As aulas
são pré-definidas e disponibilizadas aos alunos, que devem optar pelos idiomas
a serem aprendidos. Os próprios alunos, nativos de uma língua, podem corrigir lições
concluídas por outros alunos, que estão aprendendo esse idioma.
A respeito de interação, Primo
[1] nos apresenta dois conceitos: interatividade reativa e interatividade
mútua. A interatividade reativa é pré-moldada, caracterizada por uma “forte
roteirização e programação fechada que prende a relação em estreitos
corredores, onde as portas sempre levam a caminhos já determinados à priori.”.
Sendo assim, a interatividade reativa é mais determinística. Já a
interatividade mútua é mais flexível, mutável, através de um processo de
constantes trocas, portanto imprevisível.
A particularidade da rede social
Livemocha está no hibridismo entre os modelos de interação; há uma vertente das
lições extremamente engessada, muito característica de um LMS (Learning
Management System), porém a ideia de colaboração entre os alunos resgata a
essência da interatividade mútua, adicionando personalidade e flexibilidade à rede.
A análise do caso Livemocha,
objetiva entender as particularidades do uso da interatividade mútua no ensino de
línguas à distância.
Justificativa
A popularização da utilização das
redes sociais é um fenômeno mundial que atrai cada vez mais internautas no Brasil
segundo o Ibope Nielsen Online [2]. Portais educacionais e diversos sites na
Internet buscam integrar seus sites e blogs com o dinamismo das redes sociais
em busca de satisfazer os desejos dos usuários que gastam cada vez mais tempo
nas redes sociais no Brasil, e em vários países do mundo [3]. É interessante
observar como a colaboração é um pilar fundamental para o funcionamento e
sobrevivência de sites como Wikipedia entre outros. A Wikipedia é uma enciclopédia
gratuita criada e que funciona num modelo colaborativo. Este modelo se espalhou
por diversos sites na Internet [4].
O estudo de línguas também atrai
cada vez mais pessoas no Brasil, e o site LiveMocha.com ganha destaque com um
grande número de brasileiros. Uma das razões de atrair milhões de internautas é
por oferecer um serviço gratuito baseado na colaboração e este foi o principal
motivo que nos motivou a analisar mais a fundo este modelo de colaboração
aplicado para o aprendizado de línguas.
LIVEMOCHA
Estatísticas
O Livemocha é uma grande
comunidade de idiomas, com um total de 12 milhões de membros de 195 diferentes países
[5]. A presença do portal é mais forte no Afeganistão, onde ocupa o 170° lugar
no ranking nacional em visitação. Em seguida está o Cazaquistão (300°), Algéria
(665°), Azerbaijão (1.010°), Egito (1.244°) e Colômbia (1.252°). O Brasil
aparece em sétimo lugar, onde o site é o 1.314° mais acessado [6]. Apesar do
acesso ao portal ser maior nos países islâmicos, é possível ver na Tabela 1 a
distribuição de visitantes por país ao site livemocha.com. Baseado em uma média
da Internet, o site é mais acessado do ambiente escolar, por usuários entre 18
e 24 anos, que não possuem filhos [6].
Em 2011, o grupo de brasileiros
no portal representava 25% do total da base de clientes, o que correspondia a uma
fatia de 2,2 milhões de usuários brasileiros [7].
Estrutura
No Livemocha os alunos podem se
inscrever em aulas de diferentes idiomas. As aulas são desenvolvidas por unidade,
sendo que uma mesma unidade contém diferentes tipos de lições. Cada lição pode
ser do tipo:
A) Leitura – leitura e
compreensão de textos, com exercícios de interpretação.
B) Escrita – pequenas redações de
temas pré-definidos, afim com a temática da unidade.
C) Exercícios de expressão oral –
compostos por trechos de gravações de textos, a serem lidos pelo próprio aluno.
As atividades são desenvolvidas
dentro das unidades, sendo que para cada atividade é cobrado um valor determinado,
ou um valor fechado mensal. Os cursos podem também ser desenvolvidos sem
custos, através de um modelo de colaboração, tema desse texto. As correções das
atividades ocorrem de duas formas:
1. Professores tutores,
profissionais remunerados exclusivos para correção das atividades postadas
pelos usuários – serviço cobrado;
2. Correção por outros usuários,
nativos, fluentes ou conhecedores do idioma em questão – serviço gratuito.
Para o segundo caso, os alunos
interagem colaborando com conhecimentos próprios em um determinando idioma.
Assim, supondo que o usuário A queira aprender inglês e saiba japonês, e o
usuário B queira aprender japonês e saiba português, o usuário A poderá cursar
aulas de inglês mediante correção de atividades do usuário B em japonês, ou de
colaboração com outros usuários que queiram aprender esse idioma. O mesmo
ocorre com o usuário B, que poderá cursar as aulas de japonês gratuitamente,
desde que contribua para que outros usuários aprendam português. A moeda de
troca dessas interações é chamada de tokens.
É interessante observar como a
rede se auto-organiza baseado no modelo de colaboração. Através das aulas
préconcebidas, os próprios usuários compõe a rede social, colaborando para o
aprendizado dos outros, e mantendo a rede em funcionamento. Essa ideia de
colaboração é percebida no comentário coletado em entrevista dos autores a um usuário
da rede [8]: “A forma como as pessoas interagem, deixa claro que será um
esquema de troca, em que possoajudar uma pessoa e também ser ajudado! Assim
posso "descobrir" com um nativo como se fala no dia a dia, como as expressões
são usadas.”.
O sistema de recompensas mascara
a mecânica de interação mútua. A dinâmica de realização das aulas e correção de
atividade de outros estudantes é o que garante a manutenção da rede, e não o
sistema de bonificação, que na verdade nada mais é do que o direito de
participação.
Essa característica do Livemocha
obedece ao princípio de exterioridade de Pierre Lévy. A rede não tem motor interno,
“seu crescimento e sua diminuição, sua composição e sua recomposição permanente
dependem de um exterior indeterminado: adição de novos elementos, conexões com
outras redes, excitação de elementos terminais (captadores), etc.” [9]. A
experiência do usuário com o idioma a ser ensinado é que mantém a rede em
funcionamento.
Além dos tokens, que
garantem a participação dos usuários, o Livemocha conta ainda com um sistema de
pontuação, os chamados MochaPoints, concedidos através das atividades na rede
social
ATIVIDADES DO ESTUDANTE
Lições Concluídas 8
Envios de atividades de escrita 5
Envios de atividades de expressão
oral 22
Quizzes ou Ensaios Consideradas 0
ATIVIDADES DO PROFESSOR
Comentários escritos 42
Comentários em áudio 16
Primeiro a Revisar 2
Dicas Especiais Criadas 0
Traduções 0
OUTRAS ATIVIDADES
Conjuntos de Flashcard Criados 2
Bate-papos
Figura 1. Sistema de Recompensa
Mochapoints
É possível conquistar pontos
exercendo o papel de aluno ou de professor. O que delineia a quantidade de
pontos em cada quadro é o perfil pessoal de cada aluno, que opta por participar
de mais aulas ou corrigir mais lições. Todas as atividades na rede são
pontuadas, e esses pontos garantem status ao aluno, o que acaba por
classificá-lo como um participante ativo ou menos participativo.
Aspectos Comportamentais
A cada correção de atividade, o
aluno recebe um comentário redigido pelo autor da correção – nativo na língua
-, ou comentário em áudio para os casos de lições orais. Toda lição recebe uma
pontuação que varia de 1 a 5 pontos, para as seguintes categorias:
A) Ortografia: erros de
ortografia;
B) Proficiência: dificuldade de
compreensão;
C) Gramática: erros de gramática.
Não existe critério para
submissão de revisão, o que significa que um usuário pode submeter uma
avaliação sem grande utilidade a determinada lição. O aluno que recebe esse
tipo de feedback pode classificar a contribuição como ruim, o que
influencia em um critério de utilidade do usuário que submete a revisão – dado
em porcentagem.
Esse tipo de comportamento, que
visa apenas à obtenção de pontos para o corretor, deturpa o conceito da rede, pois
desqualifica o processo de interação-aprendizado. Aqui se aplica o conceito de
fios topicais [10] “linhas de conversação em redes sociais que interligam um
mesmo tópico de discussão, evoluindo a partir dessa interação”.
Mesmo que uma correção não seja
positiva, o fato do sistema permitir correções de diferentes nativos/fluentes
naquela língua cria uma linha de discussão de certa forma isolada em grau de
contribuição, mas coletiva, dado que os usuários vêm o que de positivo já foi
postado, para submeter sua própria revisão.
Outro fato interessante é notar
como o status é relevante no digital. O Livemocha, por ser uma rede transmídia,
além do portal Livemocha, possui um blog, um perfil no Facebook e uma conta no
Twitter. As três redes se conversam, criando um canal de comunicação unificado,
onde o que é postado no Facebook corrobora com as chamadas do Twitter, e o blog
faz a linkagem fora de tópico – ainda que inserido no contexto do aprendizado
de idiomas – do portal. Em um post no blog de novembro de 2011, intitulado
“Como o Batman para o Aprendizado de Idiomas” [11], alguns usuários que
colaboravam fortemente com a rede foram contatados pela mesma, com os seguintes
objetivos (tradução dos autores):
A) Distribuir o senso de ajuda
desses participantes entre todos os estudantes do Livemocha;
B) Reconhecer publicamente esses
atores como os superstars que são, e recompensá-los com conteúdo
premium;
C) Fazer com que os demais
estudantes saibam que podem confiar nos feedbacks desses “super-heróis”.
Um desses colaboradores
contatados postou em seu blog pessoal sua opinião sobre o fato:
“Esse parece um ótimo modo de
lidar com o problema de correções de usuários - ou seja, a qualidade pode
variar muito, e você nunca sabe realmente o que está recebendo. Então,
basicamente, eu sou o Batman para o aprendizado de idiomas? Legal...” [11]
Além dos citados Mochapoints, o
status digital é uma recompensa interessante. Parte do princípio de uma ecologia
cognitiva. Na definição de Santaella a “diversidade e a mistura entre razão,
sentimento, desejo, vontade, afeto e o impulso para a participação, estar
junto, cuja força brota do simples fato de que é bom estar junto, ainda mais quando
o compartilhamento, a reciprocidade e a cumplicidade não têm outro destino ou
finalidade a não ser o puro, singelo e radical prazer de estar junto” [12].
Acima do título e status de
super-herói da língua, a iniciativa do Livemocha sustenta a ideia de pertencer
ao grupo, de diferenciação, mas também do engajamento e visibilidade de árdua
participação. É o prazer de estar junto.
Outro aspecto interessante no
Livemocha é a presença do recurso de chat. É possível se conectar por sessão deáudio
a outro usuário que fala a língua que se pretende aprender. Muitos usuários
demonstram especial apreço por essa forma de interação, menos engessada ao
modelo tradicional de aprendizado formal, onde se tem um conteúdo para seguir.
CONCLUSÕES
O LiveMocha é uma estrutura
diferencial de ensino-aprendizado de idiomas em meios digitais. Sua raiz está
na interação, tanto reativa quanto mútua. O sucesso da rede está na combinação
dos modelos, tendo como estrutura um roteiro reativo mais fixo, que o aluno
segue para assimilar conceitos novos, e o adicional da interação mútua, representado
pelos outros alunos nativos na língua a ser aprendida. Esse fator flutuante da
participação e da colaboração parece ser o atrativo principal da rede, o que
ocasiona o uso de artifícios sociais, como sistema de pontuação e encorajamento
de correções concisas.
Apesar de a rede estar sujeita a
alguns desvios de participação, como má contribuição e revisões, o problema é sanado
quando se abre a uma mesma lição a possibilidade de várias interações, de
diferentes usuários. Além disso, o sistema de classificação das revisões acaba
por contribuir com correções mais precisas.
É interessante observar que a
colaboração entre os usuários que desejam aprender idiomas é um aspecto que garante
que os alunos /usuários possam continuar estudando o idioma sem ter de pagar
pelo curso. Trata-se de um modelo gratuito financeiramente onde o investimento
feito para aprender uma língua pode ser realizado dedicando tempo e esforço na
correção de atividades de outros usuários.
Observamos que a troca de conhecimento
entre os usuários, portanto, é um motor fundamental para que o Livemocha.com
continue a existir e poder ajudar pessoas a aprenderem línguas pelo mundo. Este
fenômeno de colaboração para aprendizagem gratuita na Internet é um modelo já
existente na Internet como já foi visto, por exemplo, na enciclopédia
Wikipedia.com. Outro aspecto importante, além da vontade de aprender a língua,
é o desejo do usuário e o impulso para participação e o estar junto conforme a
ecologia cognitiva de Santella [12]. Por fim, o fato dos usuários que mais participam
das correções de atividades serem reconhecidos publicamente na rede social como
muito participativo é também mais uma recompensa pela participação e pela
longevidade desta ecologia cognitiva.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] PRIMO, A. (2001). Ferramentas
de interação em ambientes educacionais mediados por computador. In A. PRIMO, Ferramentas
de interação em ambientes educacionais mediados por computador.
[2] Ibope Nielsen Online (2011). Total de
pessoas com acesso à internet atinge 77,8 milhões. Disponível em < http://www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/CalandraRedirect?temp=6&proj=PortalIBOPE&pub=T&nome=home_materia&db=caldb&docid=C2A2CAE41B62E75E83257907000EC04F>.
Acesso em 10/11/2011.
[3] NIELSEN (2010). Social Networks/Blogs Now
Account for One in Every Four and a Half Minutes Online . Disponível em
< http://blog.nielsen.com/nielsenwire/online_mobile/social-media-accounts-for-22-percentof-
time-online/>. Acesso em
15/03/2011.
[4] TAPSCOTT, Don & WILLIAMS. Wikinomics:
How Mass Collaboration Changes Everything. New York: Penguim Books,
2006.
[5] Livemocha (2012). About
Livemocha. Disponível em <http://blog.livemocha.com/about/>. Acesso em
16/03/2012.
[6] Alexa (2012). Estatísticas
LiveMocha. Disponível em <http://www.alexa.com/siteinfo/livemocha.com/>.
Acesso em 15/03/2012.
[7] INFO (2011). Abril Educação
compra parte do Livemocha. Disponível em <http://info.abril.com.br/noticias/mercado/abril-educacao-compra-parte-do-livemocha-05092011-10.shl>.
Acesso em 05/03/2012.
[8] Aluno (2012). Depoimento de
participante. Concedido em 10/03/2012.
[9] LÉVY, P.: As Tecnologias da
Inteligência. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993.
[10] McCLEARY, Leland E. (1996).
Aspectos de uma modalidade de discurso mediado por computador. Tese de Doutorado
em Lingüística, São Paulo, USP.
[11] Participante (2011).
Livemocha to give away its premium content to contributing users. Disponível em
<http://www.streetsmartlanguagelearning.com/2011/11/livemocha-to-give-away-its-premium.html?utm_source=blog>.
Acesso em 08/03/2012.
[12] SANTAELLA, L: Redes sociais
digitais: a cognição conectiva do Twitter / Lucia Santaella, Renata Lemos. –
São Paulo: Paulus, 2010. – Coleção Comunicação.
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